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Autor: Nelson S. Lima (clique na imagem)

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INTEREDUCATION 2016 (minha intervenção)


É uma grande honra para mim poder estar de novo neste congresso a convite da Unifuturo, na pessoa de meu querido amigo e notável reitor Professor Ricardo Monteiro a quem envio meus cumprimentos e, sobretudo, o manifesto da minha gratidão.

Eu hoje venho aqui com um propósito. Focar a vossa atenção para o papel das emoções nas aprendizagens.  

Eu tive sempre um enorme fascínio por aquilo que eu chamo "ciência da aprendizagem". É algo que vem desde os meus tempos de infância e mais adiante eu vou contar a vocês porquê.

Eu sou um verdadeiro apaixonado por tudo o que represente evolução. Desde criança que, embora eu nunca sentisse o chamamento para o ensino, eu me deslumbro com o fato de podermos perceber, interpretar e registrar conhecimentos ao longo de toda a vida, por muito longa que ela seja. Me recordo que meus avós, pessoas que tiveram vidas longas e maravilhosas e que me educaram (meus pais viviam no Brasil), tendo tido uma brevíssima aprendizagem escolar há mais de 100 anos, me encantavam com os relatos detalhados de seus conhecimentos, em especial os registrados em suas memórias autobiográficas. Foram magníficos aprendizes e deixaram um legado a todos os seus netos (5) que foi o amor pela busca da sabedoria e da maturidade.   

Aqui na Europa eu tenho trabalhado nos anos mais recentes com pessoas idosas que, ao contrário de meus avós, entretanto já falecidos, apresentam dificuldades de memória e de novas aprendizagens, aliás elas vivem perdendo essa capacidade.

Minha função é fazer o diagnóstico de suas perturbações e aplicar nelas terapias de estimulação cognitiva para que possam retardar o envelhecimento cerebral e cognitivo, e até mesmo recuperar algumas capacidades que se julgavam comprometidas. Tem sido uma atividade muito gratificante.

Antes disso, e durante mais de 25 anos, enquanto neuropsicólogo clínico, atendi muitos casos de problemas relacionados com dificuldades de aprendizagem e incapacidades de aprendizagem - dois problemas que afetam milhões de alunos em todo o mundo, independentemente dos países e do sistemas de ensino, e que conduzem ao fracasso académico.

Ao longo daquele período de tempo, estive com milhares de professores de mais de 200 escolas de Portugal, os quais tiveram a oportunidade de me ouvir falar sobre insucesso escolar relacionado com distúrbios de aprendizagem de seus alunos.

Também no meu consultório privado recebi milhares de crianças e adolescentes por causa de fracos desempenhos académicos, muitas vezes incompatíveis com suas altas capacidades cognitivas e também muitos adultos sofrendo problemas de memória, de concentração e de evocação de lembranças. As vítimas de Alzheimer eram as que mais me impressionavam. Mas também atendi indivíduos estressados, pessoas com manifesta ansiedade descontrolada, depressões e ainda outros com problemas neuropsicológicos mais ou menos graves e preocupantes.

Posso dizer, por conseguinte, que fui testemunha de muitíssimas situações que direta e indiretamente afetavam a capacidade de aprender e de recordar, presentes tanto em cérebros saudáveis como em cérebros doentes.

Como é óbvio, o foco principal dos problemas estava no mau funcionamento de suas memórias e no próprio processamento da informação, que é determinante para as diversas realizações mentais, como o raciocínio. Elas estavam, por alguma razão, inibidas de darem o seu melhor por mais esforços que fizessem.

Pude concluir que as pessoas, seja qual for sua idade, sua educação, seu status social e trabalho, podem ter problemas de memória e distúrbios de aprendizagem devido a uma grande variedade de causas e situações.

Aproveito para esclarecer uma situação: clinicamente, em neuropsicologia, nós consideramos dois tipos de problemas distintos relacionados com a aprendizagem. Um , o mais frequente, é a dificuldade de aprendizagem e o outro, mais complexo, é a incapacidade de aprendizagem.

A dificuldade de aprendizagem nos remete para problemas os mais diversos, psicológicos, sociais, familiares e ambientais, que impedem, inibem ou perturbam o esforço de aprender. A ansiedade, a falta de sono, a alimentação desadequada e a falta de interesse estão entre as causas mais conhecidas, geralmente se acumulando. Conhecem-se mais de 100 fatores possíveis onde podemos destacar falhas nos métodos de ensino, conflitos familiares e muitos outros.

Já a incapacidade de aprendizagem pode ser causada por problemas neurológicos, défices cognitivos, lesões traumáticas, diversas doenças e disfunções várias que tornam difícil ou perturbar a aquisição de novos saberes. A discalculia, a dislexia, certos tipos de hiperatividade, de impulsividade e défices de atenção são apenas alguns dos exemplos mais frequentes mas nem sempre corretamente diagnosticados. A questão do diagnóstico tem sido, aliás, ele mesmo um problema pois nem sempre é de fácil compreensão por haver imensos outros fatores complicando a observação médica.

No tempo em que eu andava nos primeiros anos de escola esta me assustava severamente. Havia muito violência entre os alunos e o ensino era autoritário, sendo o castigo físico muito frequente. A escola me levou à descoberta do verdadeiro medo, provocado não por monstros imaginários mas por pessoas.

Isto remete a minha a minha atenção para o papel das emoções nas aprendizagens. Esse papel pode ser profundamente negativo e debilitante como pode ser um acelerador do conhecimento. A criança feliz, com suas emoções equilibradas, sem extremos, está mais apta a aprender sem dificuldade desde que esteja livre de alguma situação contrária.

A motivação para estudar e aprender com sucesso fica facilitada graças a diversas circunstâncias onde a positividade está presente. A família e as instituições de ensino devem providenciar para que a criança goste de aprender. Isso implica promover a abertura mental para a curiosidade e o derrube do desconhecido. A criança que gosta de aprender facilita o seu próprio ensino e torna-se facilmente autodidata. O professor, sem perder o seu papel de facilitador das aprendizagens, deverá situar-se algures entre o aluno e o seu meio familiar.

O mundo mudou e hoje a escola não é mais aquela do meu tempo de infância. Não obstante, continua a produzir alunos sem motivação, professores cansados e a alimentar o insucesso escolar. As emoções continuam no centro da maioria dos problemas de aprendizagem.

Somos o animal com mais emoções. Somos o animal mais social, mesmo quando provocamos conflitos da mais diversa ordem. As emoções ajudam-nos a interpretar o mundo. Se estamos tristes, o mundo parece desinteressante. Se estamos apáticos, o mundo parece banal. Se estamos felizes, o mundo parece extraordinário.

É muito importante que às crianças (e também aos adultos que continuam a crescer) sejam proporcionadas condições para que sua inteligência seja bem sucedida e se tornem alunos apaixonados pela aventura do conhecimento.

Compreender e respeitar as nossas emoções e as emoções dos outros é um processo que deve ser transmitido e treinado o mais cedo possível. Só assim assistiremos a uma renovação, talvez mesmo uma revolução, em tudo o que diga respeito a qualquer sistema de ensino voltado para o futuro onde haverá uma forme insaciável de pensadores. O mundo precisa de pensadores. Pensadores humanistas e pragmáticos que vençam os novos e enormes desafios que se colocam ao mundo, ao nosso mundo, e ao mundo do futuro.

Me permitam citar um grande mestre meu, Dalai Lama, quando se dirigiu, um dia aos professores:
"Façam um esforço de não só transmitirem um saber, mas também de despertarem o espírito dos vossos alunos para as suas qualidades humanas fundamentais, tais como a bondade, a compaixão, a capacidade de perdoar ou o espírito de bom entendimento. Não reservem esses temas para a moral tradicional ou para a religião. Mostrem-lhes que essas qualidades são pura e simplesmente indispensáveis à felicidade e à sobrevivência deste mundo".

Termino minha intervenção com uma palavra de apoio e incitamento a quem, como eu, sofreu muitas emoções negativas durante anos e, não obstante, sobreviveu a tudo e a todos.

Busquemos dentro de nós aquela energia que é própria da vida e que dá vida à vida. Coloquêmo-la ao serviço dos nossos objetivos, projetos e sonhos, e compartilhemos toda essa força com os outros e com o mundo.

Isso é também um dos motivos porque a natureza nos conferiu tantas emoções: para podermos progredir e evoluir. E fixemos esta ideia: todo o progresso, toda a evolução, é um processo de aprendizagem. Toda a aprendizagem é uma adaptação. Ela modifica a nossa vida, modificando o próprio cérebro.

Devemos estar sempre abertos para novos conhecimentos. Não esperar que eles cheguem até nós e decididamente tornarmo-nos em exploradores do desconhecido para que continuemos nossa própria evolução pessoal e contagiarmos os outros com a nossa auto-motivação e alegria de aprender.

Nossos alunos, nossos filhos, nossos netos, nossos amigos, acabarão por nos imitar. E o mundo poderá evoluir por melhores caminhos rumo a diferentes futuros, mais promissores.

Sejam felizes e espalhem as vossas emoções mais positivas bem assim como os vossos conhecimentos por onde quer que estejam. O amor, a felicidade e o conhecimento devem ser compartilhados. Só assim haverá evolução.

Nelson S. Lima
Investigador